quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Bem vindo ao Vale de Severn - A História do Vale e da região



O ajuntamento de povoados na Nova Inglaterra que atrai intensa atividade dos Mythos de Cthulhu é bastante famoso entre os estudiosos do assunto. A região do Rio Miskatonic é conhecida como uma área onde horrendas entidades alienígenas se concentram em alarmante número. Arkham com seus segredos coloniais, Innsmouth e seus degenerados mutantes aquáticos, Kingsport e seus pesadelos vívidos e a pequena Dunwich lar de pactos negros entre homens e demônios.

Porque essa região funciona com um imã para a presença dessas forças é uma pergunta que ninguém foi capaz de responder. Teorias denotam que talvez se trate de uma interseção de ley lines, linhas de poder que se encontram formando nódulos - mais uma mácula - que atrai tudo o que de inumano e estranho existe nas cercanias.

Menos notória, mas igualmente aterrorizante é a coleção de vilarejos decadentes situados no oeste da Inglaterra, um lugar assombrado chamado de Severn Valley (Vale de Severn). Assim com o Vale de Miskatonic, o Vale de Severn enfrenta uma confluência arrebatadora de sinistras entidades que ali se reúnem e habitam.

A série de artigos a seguir investiga os estranhos fenômenos que tendem a acontecer no Vale de Severn.

Eis o que as pessoas normalmente sabem a respeito do Vale de Severn:

O Vale de Severn fica no condado de Gloucestershire a pouco mais de 110 milhas de Londres. Embora seja uma área isolada, há estações de trem que conectam Brichester às cidades de Bristol e Birmingham, grandes centros urbanos mesmo nos anos 20. As estradas são tortuosas e acidentadas, forasteiros podem se perder facilmente já que poucos trechos são bem sinalizados.

Trata-se de uma região erma, delimitada pelas montanhas de Cotswold uma cadeira de montes e ravinas escuras e opressivas. Minas de carvão e ferro pontilhavam o relevo antigo, mas estas se esgotaram no fim do século XIX pela extração selvagem durante a Revolução Industrial. Depois de abandonadas restaram apenas os velhos túneis escavados na face da montanha parecendo cicatrizes marcadas na carrancuda face do Cotswold.

A antiga Floresta de Dean se estende como um anel circundando o vale sob as sombras das montanhas. Árvores antigas nodosa e arbustos verdejante são comuns, bem como os cogumelos tumorosos que infestam as cascas das velhas árvores, os freixos contorcidos e a vegetação espinhenta. A floresta é densa e em certos trechos a vegetação jamais viu a lâmina de um machado. Trilhas e caminhos conduzem à clareiras onde se erguem estranhos círculos de pedra e monolitos negros. Num passado remoto, druidas se reuniam nesses lugares secretos para cantar e honrar suas divindades.

O caudaloso Rio Severn corre pelo Vale cruzando toda a extensão de um lado a outro. Em Severford foi construída uma ponte de pedra que conecta o vale, trata-se de uma construção antiga que remonta ao passado medieval da região.

As margens do Rio Severn possuem pedras arredondadas e escuras cobertas de limo onde pescadores em mais de uma ocasião enxergaram coisas estranhas emergir do rio apenas para mergulhar uma vez mais em suas profundezas. Aliás a profundidade dos rios e lagos do Severn Valley sempre impressionou os visitantes. Alguns atingem profundidade absurda e descambam em fossas e cavernas insondáveis. Nenhum habitante nada nessas águas escuras que exalam um odor oleoso.

Cabanas rústicas de alvernaria e telhados de palha se destacam na paisagem bucólica. Há um número considerável de fazendas de criação de animais e não é estranho encontrar ovelhas e cabras correndo livremente pelos pastos verdejantes sem um pastor que as conduza. As pessoas parecem estranhamente à vontade com o isolamento e mesmo durante o inverno quando a temperatura atinge abaixo de zero, não se vê muita cooperação entre os vizinhos.

Esse é o jeito do povo local: receioso e fechado. Uma pessoa pode morar por anos na área e jamais conhecer seus vizinhos além de umas poucas palavras.

Há cidades e vilarejos ao longo do Vale. A principal é Brichester com aproximadamente 45 mil habitantes segundo o senso realizado em 1924. Trata-se de uma cidade tranquila com uma economia baseada em indústria têxteis e na extração mineral. Seus habitantes embora fechados, são comparativamente menos sisudos que os habitantes dos pequenos povoados como Camside, Temphill e Clotton.



Algumas dessas cidades são bastante antigas, algumas remontando ao tempo da ocupação romana. Goatswood é um sentamento especialmente antigo que mal aparece nos mapas e que mudou muitopouco nós últimos séculos.

Durante a ocupação romana da região, o forte legionário de Glevum foi construído e mais tarde se tornou a cidade de Gloucester. Além de algumas poucas ruínas romanas, algumas estruturas medievais podem ser encontradas ainda hoje no condado.

Os romanos tinham uma relação no mínimo difícil com os habitantes locais, cujos costumes eram descritos pelos conquistadores como aviltantes. Alguns legionários preferiam a palavra "detestável" para descrever os habitantes originais do Vale um povo ignorante e dado a cultuar entidades que habitavam a floresta, o rio e as ravinas. Os ritos de adoração pareciam chocar até mesmo os romanos. Atos de rebeldia eram comuns e a situação progrediu para um levante no ano 138 da era cristã.

Na ocasião, o Magistrado Publius Sula exigiu da guarnição de Corinium uma legião para debelar os cultos que abundavam na área. Perseguições e assassinatos aconteciam na calada da madrugada e segundo cronistas da época entre as vítimas, figuravam a própria mulher e filha de Sula oferecidas em sacrifício a um obsceno demônio acéfalo.

Segundo a lenda, a legião em marcha para Glevum teria sido confrontada por uma criatura invocada pelos druidas que viviam no vale. Metade dos homens voltou para Corinium, alguns feridos e outros meio loucos balbuciando a respeito de horrores inenarráveis. A notícia se espalhou e uma centuria foi convocada às pressas para atacar os vilarejos rebeldes e extrair a justiça romana.

Vários povoados foram destruídos e outros tantos encontrados desertos, como se os moradores tivessem simplesmente desaparecido antes da chegada dos legionários. Não obstante o vale foi pacificado ao custo de mais de uma centena de execuções de homens, mulheres e crianças.

Os romanos deixaram o vale na mesma época em que as guarnições militares abandonaram as ilhas britânicas. O Severn então voltou ao controle dos povos nativos e alguns vilarejos simplesmente ressurgiram junto com os velhos costumes. Colonos britânicos começaram a se misturar com povos saxões.

Nos tempos medievais, o Vale era simplesmente evitado por pessoas de bem. O povo local expulsava quaisquer fazendeiros ousados a ponto de tentar se fixar na área. Em 1256 é mencionada uma tentativa de instituir a fé cristã no Vale de Severn, os missionários chacinados foram martirizados séculos mais tarde.

Contudo, o povo da região parecia ter aprendido a não desafiar as instituições mais poderosas de sua época e nos anos seguintes padres começaram a ser aceitos para que a região não fosse uma vez mais objeto de disputa. O relato de alguns desses párocos mostra que velhas tradições ainda vigoravam. O padre de Warrendown relatava a prática de sabás e rituais orgiásticos ligados a fecundidade do solo. "Cabras e Bodes Negros eram usados em danças profanas para abençoar os campos e as mulheres" escreveu um sacerdote ao seu supervisor em Cantervile no ano de 1374.

No tempo dos puritanos, Matthew Phillips um dos líderes mais fervorosos acusou o vale de ser a morada de idólatras e cultuadores do demônio. "Uma região que faz fronteira com o inferno e que recebe as hostes demoníacas em seu próprio seio". Phillips não deve ter se sentido muito à vontade com a escolha de seu novo lar, visto que ele imigrou para a América se fixando na região de Arkham.

Boatos sempre abundaram a respeito dos habitantes locais, desde fuxicos a respeito de casamentos entre parentes até coisas mais sérias como a suspeita de que muitos homens e mulheres na região eram bruxos e feiticeiras.

Mesmo nos anos 20-30, o Vale de Severn desperta uma certa aura de suspeita por parte de seus vizinhos mais próximos.

Todos parecem ter uma ou duas estórias para contar a respeito de algo que aconteceu ou de algo que foi visto nas matas durante a noite. Mais do que desconfiança, os habitantes mais velhos sabem que algumas dessas estórias são verdadeiras, ainda que os mais jovens prefiram dizer que não passam de estórias de viúvas.

Pior do que as estórias são as comparações quanto a fisionomia de alguns dos habitantes locais com os animais que granjeam pelos pastos. Muitos dos locais guardam traços que remetem a bodes e cabras. Os mais discretos tendem a ocultar esses traços com roupas pesadas, adornos na cabeça e barba. Poucos falam abertamente desse estranho visual e preferem ignorar essas peculiaridades, mas conta-se que em pequenas cidades como a isolada Goatswood, onde forasteiros raramente se aventuram, podem ser vistos andando pelas ruas, pessoas cuja aparência remete aos faunos da mitologia clássica.

A seguir:
"A História Secreta do Severn Valley"

4 comentários:

  1. ...otimo cenario para uma investigação...parabens...

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  2. O Severn Valley oferece muitas opções para tornar uma sessão assustadora.

    É um dos piores e mais mortíferos recantos do mundo. Não por acaso duas das aventuras que mais gostei de mestrar se passavam no Severn Valley: Goatswood e Camside.

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  3. Maravilhoso texto... Deixa um gostinho de "curiosidade suicida" no ar... hehehehehhe

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  4. Os romanos e depois os cristãos queriam conquistar a região e para isso distorciam as estórias. Essa é uma região que resistiu e o culto considerado demoníaco era o paganismo celta, apenas. Demônios são os invasores que não respeitam as tradições dos lugares. A história já está revendo essas concepções preconceituosas fruto de relato de conquistadores.

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