terça-feira, 9 de abril de 2013

Cinema Tentacular: Mama - Amor de Mãe dura para sempre


Semana passada fui com uns amigos assistir o filme Mama no cinema e foi uma ótima surpresa.

Primeiro: Eu não esperava que Mama fosse conseguir aquilo que se espera de bons filmes de horror: causar alguns bons sustos.

Segundo: Eu realmente não esperava ver algo novo quanto a estórias de fantasma, porque, francamente quase tudo já foi mostrado quando o tema são assombrações.

Felizmente eu estava duplamente enganado.

Da minha parte fiquei muito satisfeito, embora alguns dos colegas que assistiram a mesma sessão tenham dito que ficaram frustrados. Francamente, acho que muitos de nós, fãs de horror, nos tornamos severos demais com os filmes do gênero. Não me entendam mal, nada contra estabelecer um alto padrão, mas canso de ouvir algumas pessoas dizendo "se o filme não me deixa apavorado, é porque não presta."

Ora... para gostar de um filme de horror o cara tem que sair do cinema aterrorizado?

Sejamos justos, quantas vezes isso aconteceu? Quantas vezes um filme se converteu numa experiência profunda de horror?

Mama pode não ser um clássico instantâneo de horror ou um filme impecável, do qual você vai lembrar por anos, mas caramba... será que é preciso tudo isso para que a gente se dê por satisfeito?

Na minha opinião, Mama consegue superar as expectativas e entrega o que promete: pouco mais de uma hora e meia de suspense, honestos calafrios e pelo menos uns dois sustos de primeira (do tipo que fez um desses  meus colegas literalmente pular da cadeira, apesar dele depois não reconhecer).


O filme marca a estréia nos cinemas de Andrés Muschietti. O sujeito já havia filmado Mama como um curta metragem de mesmo nome, que atraiu a atenção do diretor mexicano Guilhermo Del Toro que teve a ideia produzir essa adaptação. Segundo Del Toro, o curta de Muschietti tem uma das cenas mais sinistras que ele já viu, o que o levou a procurar o sujeito e oferecer a ele a direção de um longa metragem inspirado naquela mesma estória.

Não sei se é verdade, mas o curta metragem intitulado Mamá é realmente muito bem feito e vale a pena ser assistido (está no final dessa resenha em versão dublada). Mas vamos falar do longa metragem, já que é o que interessa.


Mama favorece uma narrativa de horror primordial, denso e bastante humano. Ele não é sobre vingança, maldição, ou mesmo sobre maldade pura e simples, temas que estão presentes em 99% dos filmes sobre fantasmas. Ao invés disso, ele trata de afetividade e rejeição, duas faces da mesma moeda, sentimentos que se tornam doentios e que progridem para uma escalada de loucura e ódio.   



O filme se inicia em 2008, com Lucas (Nikolaj Coster-Waldau, mais conhecido como Jaime Lannister da série Game of Thrones), um investidor fracassado, dirigindo em alta velocidade através de uma estrada sinuosa. No banco de trás do automóvel estão Victoria e Lilly (Isabelle Nélisse e Megan Charpentier) suas duas filhas de três e um ano, sequestradas depois que ele perdeu a cabeça e cometeu um ato de loucura. Após um violento acidente, o sujeito leva as meninas através de uma floresta e encontra uma cabana abandonada. As crianças são salvas por uma bizarra entidade que reside nesse lugar.


Cinco anos se passam, e as meninas são dadas como desaparecidas, supostamente mortas. Na verdade, nesse tempo todo elas ficaram na cabana da floresta, sob a supervisão exclusiva da entidade que as protegeu. Sem um adulto e longe da civilização, elas acabam revertendo a um estado primitivo; Lilly anda apenas de quatro como um animal e emite rosnados quando assustada. O isolamento termina quando elas são encontradas por acaso e levadas de volta a civilização. 


As duas passam por uma triagem de psiquiatras e finalmente são entregues a seu tio, Jeffrey (também Nikolaj Coster-Waldau), que sempre alimentou a esperança de reencontrá-las. Jeffrey vive com sua namorada Anabel (Jessica Chastain), baixista de uma banda punk dedicada a sua carreira. Ela não está nem um pouco animada com a perspectiva de ganhar duas filhas problemáticas de uma hora para outra, mas acaba arrastada pelas circunstâncias. Apesar das dificuldades, ela aceita se mudar com Jeffrey e as crianças para uma mansão cedida por um ambicioso psiquiatra o Dr. Dreyfuss (Daniel Kash) que quer estudar o caso mais a fundo.

A medida que Annabel e o psiquiatra passam algum tempo com as meninas e tentam ganhar sua confiança, fica claro que elas acreditam na existência de uma presença invisível que zelou por elas enquanto estavam na cabana. Uma "amiga imaginária" que elas chamam de Mama. É claro, não demora até que Mama, se prove real e que venha atrás de suas crianças desejando continuar a zelar por elas.

E é na relação entre a assombração as meninas que se encontram as cenas mais interessantes do filme. O fantasma é uma entidade com um enorme vazio emocional, que quando viva cultivou essa mesma carência e que depois da morte devotou sua existência sobrenatural  às crianças. Seu único propósito é cuidar delas e quando elas são retiradas de sua guarda. seu propósito parece se esgotar. Da mesma forma, as meninas dependem de Mama e em um primeiro momento não conseguem esquecer dela, sobretudo Lily, que nunca teve contato com outras pessoas além da irmã mais velha. A primeira aparição das meninas, quando elas são encontradas é simplesmente genial e transmite uma aura de estranheza e pena na medida certa. Dali em diante as melhores cenas são aquelas em que a relação das meninas com Mama é sugerida sem que nada seja efetivamente mostrado. Não vou contar mais para não estragar, mas posso dizer que o resultado é inquietante e absolutamente sinistro.


Lá pela metade do filme, quando finalmente as crianças começam a ceder algum espaço para seus novos guardiões, o caldo entorna e Mama fica furiosa. Tomada por um ciúme doentio e o sentimento de rejeição ela vai atrás das crianças e dos estranhos disposta a tudo para reaver suas "filhas".

O filme é saturado de sombras agressivas, espaços confinados e cenas em que formas aparecem nos cantos da tela. Tudo isso, claro com o objetivo de deixar o espectador em posição de alerta e fazer com que ele tome alguns bons sustos.

Um dos trunfos de Mama é se amparar em uma estória bem contada e amarrada. O tema "amor de mãe", é recorrente na biografia cinematográfica de Del Toro, presente em trabalhos anteriores como "O Orfanato", "Não tenha medo do Escuro" e embora menos incisivo, visível também em "O Labirinto do Fauno". Talvez o assunto tenha contribuído para atrair o produtor, que viu méritos no curta metragem. O roteiro do filme tem um foco bastante interessante (senão original) a respeito da ligação entre mãe e filha, e o que acontece quando essa ligação descamba para a rejeição. É claro, existem muitos clichês presentes, mas não é algo que particularmente incomode. Eu defendo até que certos clichês são necessários em filmes de suspense e terror para construir um determinado clima e reforçar a sensação de apreensão do espectador. Mama consegue ser bem sucedido nesses dois quesitos sem recorrer em momento algum a sangue, vísceras ou tortura.

O segundo mérito de Mama é ter conseguido reunir um ótimo time de atores, dispostos a "vender a estória". Não é sempre que filmes no gênero horror podem contar com uma atriz de primeira grandeza como Jessica Chastain (indicada duas vezes ao Oscar) que concede credibilidade a uma personagem que a princípio não é nem um pouco simpática. No início do filme fica evidente seu desgosto diante da situação e ela demora a aceitar o papel de mãe. Nikolaj Coster-Waldau também convence como o tio que quer se tornar uma figura paterna e no processo redimir os erros de seu irmão gêmeo. Mas no fim das contas, são as duas pequenas atrizes que roubam a cena em papéis difíceis, mesclando momentos de fragilidade infantil com personalidade e maturidade. "Crianças estranhas" se tornaram lugar comum em filmes de horror nos últimos tempos, mas estas duas meninas conseguem convencer como crianças que cresceram nas mais bizarras condições e que tentam se ajustar a nova realidade que lhes é imposta.


Finalmente, o personagem título Mama, foi criado com uma combinação de CGI e por Javier Botet um ator espanhol incrivelmente alto e magro que emprestou sua silhueta para compor a criatura. A ideia segundo o diretor é que a criatura/ fantasma/ monstro/ demônio fosse ao mesmo tempo assustadora e patética. De modo que criasse uma reação inicial de horror, mas ao mesmo tempo inspirasse compaixão. Na minha opinião a Mama ficou perfeita! Ela consegue ser bizarra: com seu cabelo flutuando, rosto assimétrico, a boca aberta em um esgar cadavérico, olhos fundos, vazios. Sempre que surge em cena ela causa aquela sensação de estranheza, graças a um tipo de movimentação que faz com que ela pareça flutuar rapidamente no ar. Não é a primeira vez que se vê esse tipo de movimento em filmes de fantasmas, mas aqui ele é usado de forma muito eficiente, gerando um genuíno impacto cada vez que a criatura aparece. É claro, para aumentar o choque (e proporcionar mais sustos) o diretor recorre a truques típicos como aumentar a intensidade dos ruídos orquestrados, ou fazer a aparição surgir repentinamente quando menos se espera. Em pelo menos duas ocasiões o cinema explode em um susto coletivo, típico de montanha-russa.

Enfim, para os que leram tudo isso, vou fechar o texto recomendando que assistam esse filme.

Mama é um suspense com boa substância, com um roteiro coeso e interpretações sólidas e acima de tudo humanas. É primeiro filme de horror de peso a estrear esse ano. O filme me lembrou bastante "Os Outros", mas me pareceu mais bem realizado e com um conceito muito mais interessante. 

Definitivamente uma estória que vale a pena ser contada e vista!

Trailer legendado:

    

E o curta metragem que originou o filme:

2 comentários:

  1. Ótima resenha estava com vontade de assistir esse filme e agora a vontade só aumentou, vou conferir, valeu!!!

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  2. Não assisti ao filme, vou tentar fazê-lo. Essa última foto ("Mama"), dependendo do ângulo que vc olhar ela parece se mexer! Valeu.

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