domingo, 20 de dezembro de 2015

Medo nas Profundezas - O Submarino Assombrado da Grande Guerra


Durante os dramáticos anos da Grande Guerra (1914-1918), uma aterradora máquina de destruição foi lançada nos mares: o submarino. Nunca antes uma arma de guerra havia sido utilizada de maneira tão eficiente e letal. Os alemães, em especial, empregaram os submarinos de modo igualmente espetacular e mortífero. Silenciosos e furtivos, eles apareciam do nada, sob as águas escuras para destruir seus alvos e fazer vítimas com enorme precisão. Os submarinos alemães, conhecidos como U-boots ou U-boats, uma simplificação de Unterseeboot ou literalmente "barco submerso" eram o terror dos mares, sobretudo dos comboios cargueiros e mercantis que levavam suprimentos e munições para as tropas. Estima-se que milhões de toneladas de carga tenham se perdido até o fim da guerra. 

Embora essas bestas de ferro tenham aterrorizado o inimigo, forças misteriosas parecem ter agido à bordo de ao menos um U-Boat durante o conflito, plantando a semente do pavor também no coração da tripulação. Os acontecimentos nessa embarcação foram amplamente documentados e alçaram essa bizarra estória ao panteão das lendas e mistérios marítimos. 

O submarino UB-65 era uma embarcação Tipo UB III construído e comissariado para o uso da Marinha Imperial Alemã em 1916. Era uma incrível máquina de destruição que cumpria seu propósito: semear confusão, terror e caos entre os inimigos. Em seu primeiro ano de serviço, ele já havia conquistado uma sinistra reputação, tendo afundado vários navios, convertendo-se rapidamente no pesadelo dos comboios que cruzavam o Mar do Norte.

Reza a lenda que a construção do submarino foi marcada por vários acidentes esquisitos e mortes inexplicáveis. Em um incidente enquanto o casco era montado, um enorme guindaste que segurava uma placa se rompeu e uma corrente de ferro se soltou atingindo os operários. Dois homens foram literalmente cortados no meio pela corrente e outros cinco esmagados pela placa. Dos cinco trabalhadores, três morreram imediatamente, mas dois ficaram parcialmente  sob a pesada placa e agonizaram por horas enquanto seus colegas tentavam desesperadamente erguer a chapa de ferro. O acidente foi considerado uma fatalidade, mas os inspetores de segurança ficaram aturdidos ao constatar que a corrente em perfeito estado, simplesmente se partiu.

Em outro acontecimento espantoso, três engenheiros estavam conduzindo um teste com baterias, quando uma delas superaqueceu e começou a expelir uma fumaça tóxica. A substância rapidamente preencheu o compartimento e incapacitou os homens. Seus corpos só foram removidos no dia seguinte por uma equipe de resgate vestindo máscaras contra gás. Uma vez mais, não houve uma explicação razoável para o acidente fatal.



Esses bizarros acontecimentos que pareciam sinalizar com todo tipo de mau presságio não terminariam com o término da construção do submarino. Durante um teste para avaliar o funcionamento do motor, o UB-65 encarou uma terrível tempestade que surgiu de repente e varreu um dos tripulantes para fora do barco em uma enorme onda. O corpo do marinheiro jamais foi recuperado. A morte de um marinheiro durante um teste já era considerado um péssimo sinal, mas o desaparecimento de seu corpo lançava um espectro de apreensão em todos à bordo.

Pouco depois disso, em outro teste, um compartimento foi inundado e por pouco o submarino não afundou para sempre. Dois técnicos ficaram até o último momento tentando salvar a embarcação e embora tenham conseguido escoar a água acabaram morrendo asfixiados por um vazamento de gás carbônico.   

A essa altura, a fama do UB-65 já havia se espalhado entre os marinheiros. Alguns o consideravam maldito, circulava o rumor de que o ferro e muitas peças usadas em sua construção haviam sido reaproveitadas de outras embarcações, inclusive navios inimigos capturados e desmontados no início da guerra. Outros afirmavam que os fantasmas dos homens que haviam morrido na construção estavam para sempre presos na barriga daquela besta de ferro. 

A reputação malévola do UB-65 fez com que o Almirantado Alemão expedisse uma comunicação oficial afirmando que o submarino havia sido construído conforme todas as exigências e requisitos técnicos. Mas os marinheiros continuavam sussurrando estórias sobre o submarino maldito, ao ponto das autoridades navais suspenderem cinco marujos por espalhar essas estórias. Em 1917, a despeito de todos os problemas, o UB-65 foi despachado em sua viagem inaugural. Se havia realmente alguma força sinistra infestando o submarino, ela não tardou a dar sinal de alerta. A medida que os torpedos eram colocados nos tubos para sua primeira missão, um deles detonou acidentalmente matando um segundo oficial, o Tenente Joachin Richter. A despeito da tragédia, os alemães necessitavam urgentemente de mais U-boats para cortar as linhas de abastecimento dos britânicos com o continente, por isso ordenaram reparos imediatos e o lançamento do submarino. 


A essa altura o UB-65 que já era considerado um submarino maldito, passou a ser também tratado como assombrado. O primeiro fantasma visto pela tripulação apareceu três semanas após sua partida do porto de Danzig com destino ao Canal Britânico. A missão era atacar um comboio de doze navios britânicos que haviam partido de Dover com destino a Calais. Durante o turno de guarda, um dos vigias que estava no posto reparou na presença de um homem e deu sinal de alerta. Aquilo era totalmente estranho já que as escotilhas estavam fechadas e não havia como alguém sair e caminhar pelo tombadilho. Apesar do comandante ter interpretado o alerta como uma confusão da parte do vigia, outros marinheiros afirmaram ter ouvido o som de passos no tombadilho no mesmo momento em que o alerta foi emitido. Nos dias seguintes ao incidente, dois outros marinheiros afirmaram ter visto o homem misterioso à bordo. Quando um dos homens descreveu a aparência do sujeito, os marinheiros mais velhos ficaram chocados, a aparência dele se encaixava na do falecido Tenente Richter. 

Pouco depois disso, um marinheiro correu para contar aos seus colegas que havia visto o Tenente Richter casualmente andando pelo deck. O capitão mandou colocar o marinheiro à ferros, mas outras visões se seguiram com alarmante frequência. Em um dos avistamentos, o corpo do Tenente parecia simplesmente flutuar acima do deck até desaparecer no ar. O Tenente parecia surgir aleatoriamente: por vezes ele era visto andando pelo estreito corredor, outras na sala de máquinas fazendo leituras dos aparelhos e em outra na sala de torpedos, onde foi visto chorando e lamentando pelo seu destino. Em uma de suas aparições mais aterrorizantes, ele teria avisado um marujo que todos à bordo estavam condenados e que o UB-65 seria mandado para as profundezas antes do fim da guerra. Nessa aparição, o tenente surgia com os ferimentos que causaram sua morte: sangue escorrendo de horríveis feridas, as roupas rasgadas e um braço arrancado. O fantasma de Richter ganhou a companhia de um engenheiro de rádio que morreu em um acidente algumas semanas mais tarde. Os dois foram vistos conversando em pelo menos duas ocasiões pelos aterrorizados tripulantes.

O capitão fez o possível para desencorajar essas estórias, impondo pesadas punições para os marinheiros que ousassem falar a respeito de fantasmas, mas nem assim os rumores pararam de circular. Mas o ponto de vista do próprio comandante foi desafiado quando ele viu com os seus próprios olhos um fantasma. Durante uma forte tempestade, o submarino recebeu ordens de ir à superfície para verificar a situação climática. Quando um tripulante olhou pelo periscópio, ficou chocado e começou a gritar. O capitão prontamente observou o exterior e estarrecido constatou que havia realmente uma pessoa do lado de fora. A figura, descrita pelo próprio capitão como um homem de aparência muito semelhante ao Tenente Richter, vestia um uniforme em farrapos e observava o horizonte cinzento, desafiando a oscilação da embarcação e os ventos fortes. A visão foi tão surpreendente que o comandante foi incapaz de manter a compostura. Ele ordenou que a escotilha fosse aberta e que três homens fossem averiguar o que estava acontecendo, pois certamente havia alguém do lado de fora. Ao abrir a escotilha, nada encontraram.


Todas essas estórias ajudaram a construir a notoriedade do UB-65 entre os marinheiros da Marinha Imperial. Não obstante, a tripulação do submarino possuía um notável desempenho de serviço. O UB-65 era um dos submarinos com maior margem de sucesso em missões e um número invejável de embarcações torpedeadas: seis navios mercantes afundados e mais seis avariados. Ainda assim, muitos marinheiros se recusavam a servir à bordo dele, e os que eram obrigados a fazê-lo, logo pediam transferência. O moral da tripulação estava sempre baixo e todos se queixavam de exaustão, dores de cabeça e insônia. Pesadelos também eram frequentes: sonhavam com vultos andando pelos corredores, ouviam sussurros e lamentos incorpóreos e alucinavam com aparições. No Natal de 1917, três marinheiros e um oficial simplesmente desertaram e não retornaram para cumprir suas funções à bordo. O melhor amigo do Tenente Richter, um colega de bordo se enforcou durante uma folga. 

O alto comando chegou a enviar um pastor luterano para abençoar o submarino e assim dispersar qualquer espírito que estivesse habitando a nave. Durante a cerimônia, o pastor teria desmaiado e se mostrou incapaz de concluir o serviço religioso. Depois disso, um observador da Marinha foi enviado secretamente para investigar o que estava acontecendo no UB-65. Após realizar cuidadosas entrevistas com os tripulantes, ele formulou um longo inquérito no qual deixava claro que os tripulantes de fato acreditavam que o submarino era amaldiçoado. O inquérito foi lacrado e permaneceu fechado por mais de 50 anos; nele pode ser vista a seguinte conclusão: 

"Não estou afirmando que o UB-65 é realmente assombrado pois não há como averiguar tal coisa. Contudo, o que posso certificar é que os tripulantes da referida embarcação acreditam ser ela assombrada. Minha recomendação é que os tripulantes sejam transferidos para outras naves e uma nova equipe seja formada, sob o comando de outro capitão e oficiais graduados"

Surpreendentemente, o alto comando acatou o conselho do observador e escolheu a dedo uma nova tripulação e um novo capitão. Para driblar os rumores a respeito do submarino ser assombrado, o UB-65 recebeu uma nova designação e passou a se chamar UB-77. O Capitão Dieter Shreder se tornou o novo comandante do barco e impôs ordens rigorosas de disciplina. Durante um período de três meses, o UB-77 realizou suas missões sem nenhum incidente estranho. Infelizmente, seja lá que força estava espreitando no submarino, não havia desaparecido, estava apenas dormente.


Em maio de 1918, o UB-77 recebeu a tarefa de patrulhar uma linha de abastecimento entre o Estreito da Inglaterra e a Costa da Espanha. Durante sua missão, um oficial afirmou ter visto um vulto andando pela sala de torpedos, mas quando foi buscar ajuda a misteriosa figura havia desaparecido. Outro tripulante disse ter encontrado um homem desconhecido na sala de engenharia e este disse se chamar Richter. O tripulante foi atacado e sofreu ferimentos condizentes com mordidas. A experiência supostamente deixou o engenheiro insano, e para conter seus gritos os demais tripulantes tiveram de amarrá-lo em um armário. Certa noite, o engenheiro enlouquecido conseguiu se libertar das amarras que o prendiam e abriu uma escotilha caindo no mar. Seu corpo nunca foi recuperado.

A estória do submarino maldito chegaria a uma conclusão tão bizarra quanto as lendas que o acompanhavam até então. Em 10 de julho de 1918, na Costa de Corwall na Irlanda, um submarino norte-americano cruzou o caminho do UB-77 quando ele estava na superfície. Aquela era uma posição muito arriscada para o submarino, já que na superfície sua capacidade de manobra era tremendamente reduzida. O comandante americano observou a nave alemã pelo periscópio e percebeu que ela estava avariada e provavelmente não era capaz de submergir. Na escotilha havia um único tripulante acenando com uma bandeira branca. Ele gritava algo, mas os americanos não foram capazes de entender suas palavras. Acreditando que eles estavam se rendendo, o Capitão americano ordenou que o submarino fosse à superfície e uma equipe se preparasse para a abordagem em um bote. 

Foi então que o UB-77 explodiu de maneira espetacular sem nenhum motivo aparente. O submarino americano não efetuou nenhum disparo e não havia nenhuma outra embarcação nas proximidades. A explosão foi tão potente que causou pequenas avarias no submarino americano. Supostamente a detonação foi causada por mal-funcionamento em um torpedo ou talvez por determinação do Capitão Schrader que preferiu destruir a embarcação ao invés de deixá-la cair em mãos inimigas. Toda a tripulação do UB-77, no total, 33 homens, se perdeu na explosão. Esse é um dado interessante: eles "se perderam", uma vez que nenhum cadáver foi recuperado dos destroços fumegantes.

Anos mais tarde, bem depois do fim da Grande Guerra, o capitão americano ficou sabendo da estranha estória do submarino destruído diante dos seus olhos. Na ocasião, ele buscou saber mais detalhes e reconheceu uma fotografia do homem que acenava com a bandeira pouco antes da explosão. A fotografia era do falecido Tenente Richter. 


Por muito tempo, os destroços do UB-77 permaneceram perdidos e o mistério sobre sua explosão e naufrágio continuaram como um enigma de guerra. Finalmente, em 2004, arqueólogos submarinos encontraram sua localização exata e realizaram um trabalho de resgate dos destroços. Uma análise dos restos, realizada por engenheiros de submarino, não encontrou sinais de que a explosão tivesse sido resultado da detonação de um torpedo ou de qualquer outra arma de bordo. As escotilhas de disparo entretanto estavam abertas, o que pode indicar que os tripulantes tentaram evacuar a embarcação antes dela explodir. |Outra possibilidade é que o motor ou as baterias tenham super-aquecido e explodido, mas nesse caso, haveriam maiores danos na sala de máquinas. Sem uma explicação para o que ocasionou a explosão, o inquérito da Marinha Alemã, finalizado 86 anos após a destruição do UB-77 foi concluído com as insatisfatórias palavras: "causa acidental".

O que realmente teria acontecido com o UB-77? Seriam as estórias sobre incidentes fantasmagóricos verdadeiras ou apenas o resultado do stress da tripulação? Em que circunstâncias o submarino foi destruído e o que causou a explosão? Mais importante, se havia realmente uma força sobrenatural habitando a embarcação, o que teria acontecido com ela após a destruição? Ela teria sido eliminada ou a descoberta dos destroços causaria seu retorno?   

A Grande Guerra ficou conhecida como "A guerra para terminar com todas as guerras" e todos os que se envolveram nela passaram por horríveis momentos... mas talvez, os tripulantes da fatídica viagem do UB-65 tenham enfrentado algo ainda pior. 

Algo que provavelmente, jamais seremos capazes de compreender... 

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