terça-feira, 27 de agosto de 2013

A Congregação - Foco, Objetivo e Tema de uma Ambientação onde religiosos enfrentam o Mythos (parte 2)

Dando continuidade às postagens a respeito da Congregação, com ideias para cenários de campanha envolvendo Grupos Religiosos, no caso aqui ligados ao Vaticano e a Santa Sé, devotados a combater o Mythos de Cthulhu.

Aqui o foco, o objetivo e o tema desse tipo de campanha.

Para quem não leu a primeira parte pode acessar por este link: A Congregação - para saber do que estamos falando.

Foco


A esfera de ação da Congregação tende a ser mundial, atravessando nações e fronteiras, assim como a influência da própria Igreja Católica.

Embora tenha sede no Vaticano, a Irmandade não está sujeita a sua autoridade governamental e não se submete a questões de jurisdição e territorialidade. Seus membros agem secretamente como e onde bem entenderem como agentes livres. Os irmãos são em sua maioria membros do clero, mas também há leigos nas suas fileiras. Embora disponham de certa liberdade, isso significa também que eles não possuem qualquer autoridade legal. Se por um acaso, um membro for preso ou processado por autoridades locais, ele será visto como um criminoso comum.

Existem, é claro, simpatizantes que por vezes aceitam ajudar ou "fazer vista grossa" a respeito das ações da Irmandade. Membros honorários na polícia, nas cortes legais e no próprio exército já se provaram muito úteis concedendo suporte e guarida para irmãos em missões. Mas esses casos são excepcionais. Na maioria das vezes, as missões da Irmandade tendem a ser discretas para não atrair atenção indesejada.

Os grupos de investigadores da Irmandade da Espada de St. Jerome são em geral muito semelhante aos grupos de investigação agindo no limite da legalidade. São grupos formados por quatro a seis membros, cada qual com a especialização necessária para a situação. Em geral há pelo menos três Osservatores e dois Sicarri em um grupo principal, coordenados por um Diácomo. Na equipe de suporte podem haver outros Sicarri (se a missão envolver algum grau de risco ou confrontação), pelo menos um Sollievo e uma equipe de limpeza (Pullizia) para ocultar os rastros deixados pela equipe de campo. Dependendo do tamanho da operação um ou dois prelados podem ajudar fornecendo suporte.  

Falando dessa maneira, a Irmandade parece uma organização bem estruturada e preparada para lidar com qualquer situação. Mas não é bem assim. Se a algo previsível quanto ao Mythos de Cthulhu é sua imprevisibilidade. Na maioria das vezes, os irmãos não sabem o que vão encontrar até que os Osservatores iniciem a investigação. E mesmo assim, muitas vezes eles se vêem diante de algo que os surpreende. Muitas missões que parecem rotineiras acabam se transformando em um caso para os Sicarri.

A grande diferença entre um "grupo convencional" de investigadores do Mythos para os membros da Irmandade é que estes possuem recursos operacionais muito maiores, equipamento de primeira (inclusive armamento) e o apoio de uma organização legítima disposta a ajudá-los e acreditar em suas descobertas. Outra vantagem é que os Irmãos contam com um conhecimento básico sobre o que estão enfrentando e podem recorrer aos Tutore para que estes os mantenham informados sobre o que é descoberto e/ou encontrado no decorrer da investigação. Contar com um dos maiores arquivos existentes sobre os Mythos (A Coleção Z) também é uma vantagem considerável.

Nesses dias em que a Igreja Católica se mostra muito sensível a escândalos, a Congregação prefere agir de modo discreto. Seus agentes evitam ter suas ações nas manchetes de jornais, embora de tempos em tempos seja impossível evitar a troca de tiro com cultistas ou a sabotagem com dinamite de algum sítio arqueológico.

Quando a violência parece ser a única solução, a Congregação se volta para os Sicarri e espera que eles façam o necessário para cumprir a missão. É claro, inocentes devem ser poupados de qualquer envolvimento, mas em algumas circunstâncias, os Diáconos estão dispostos a tolerar dano colateral, desde que para alcançar o bem maior.

A Irmandade deixa claro que não irá oferecer qualquer ajuda pública a agentes capturados. É possível que o Vaticano através de intermediários realize o pagamento de fianças, contrate advogados ou manipule o sistema para livrar seus homens, mas nem sempre isso é possível. Espera-se também que os agentes respeitem o código de silêncio que lhes é imposto e jamais revelem o que sabem, nem na iminência de prisão, tortura ou morte. Essa é a conduta esperado dos soldados de Deus.

Objetivo


Os objetivos principais da Congregação são dois: 

O primeiro e mais importante busca a eliminação física de manifestações sobrenaturais malignas. As forças do Mythos, sua influência e suas criaturas são consideradas a suprema anátema contra Deus e a criação. Embora a definição correta do Mythos escape aos irmãos, que o consideram como uma ramificação direta do Grande Inimigo (O Demônio), a Irmandade da Espada de St. Jerome entende o Mythos como algo supremamente maligno, capaz de afligir a humanidade e causar sua obliteração. Eles acreditam que se a Igreja cruzar os braços diante das depredações do Mythos, o futuro da própria raça humana estará em perigo. Combater esse mal é portanto uma questão de sobrevivência.

O segundo objetivo envolve suprimir o conhecimento profano e impedir que o público saiba  da existência factual do Mythos. Se o mundo um dia soubesse a verdade, o desespero tomaria conta da humanidade, a desesperança varreria as populações, a Igreja perderia milhares de seguidores e pior, alguns até poderiam se voltar para a adoração dessas entidades negras. Desde a sua criação, uma das principais frentes de batalha da Congregação tem sido averiguar, localizar, salvaguardar ou destruir fontes de conhecimento blasfemo.

Muitos membros da Irmandade suspeitam da real natureza do Mythos, mas esse conhecimento apenas os incentiva a um maior zelo em suprimir a verdade. Para muitos membros da Congregação, encobrir a realidade é tão importante quanto eliminar cultistas, fechar portais dimensionais ou banir criaturas invocadas.    
A destruição de tomos e artefatos ligados ao Mythos sempre foi um dos objetivos principais da Congregação, mas ele ganhou força nos últimos séculos. A partir do século XIX, a circulação de livros e do conhecimento impresso se tornou um grave risco aos olhos dos irmãos, um problema que só se agravou nos séculos seguintes. Pior ainda, a maioria das pessoas não estava mais disposta a temer esse saber, pelo contrário, muitos estavam dispostos a abraçá-lo. A pressão de tantos séculos da Igreja sobre esse conhecimento perdera sua firmeza. 

O zelo da Irmandade a respeito dessa questão os impede de utilizar o valioso arsenal que dispõem contra seu inimigo declarado. Magias, rituais e artefatos tendem a ser trancafiados nos porões abaixo dos Museus da Santa Sé, isso quando não são destruídos. É extremamente raro que a Irmandade empregue qualquer desses itens, a não ser após um cuidadoso escrutínio, algo que que pode levar décadas.

Essa postura pode, e de fato, ocasiona conflito entre membros da Irmandade e investigadores que pretendem enfrentar o Mythos utilizando nessa batalha quaisquer meios a seu alcance. A chave para lacrar um portão dimensional, expulsar uma criatura ou remover uma manifestação pode estar contida nas páginas do tenebroso Necronomicon ou nas margens de algum pergaminho medieval escrito com tinta invisível. O cuidado excessivo dos irmãos a respeito dessa questão acaba limitando suas próprias ações e gerando obstáculos. É claro, dentro da ordem existem membros que advogam "usar fogo contra fogo" no combate ao Mythos, mas estes agem com cuidado sabendo que esse argumento pode ser extremamente perigoso e até visto como herético. Circulam rumores dentro da irmandade que alguns membros inclusive se retiraram da ordem por não concordar com essa diretriz sobre o uso dos itens em seu poder. Alguns rumores falam até na formação de uma irmandade formada por renegados dispostos a tudo para lutar em grau de igualdade.

Seja como for, é inegável que a Irmandade tem em seu poder uma coleção quase inesgotável de armas que poderiam ser usadas contra o Mythos. Mas ironicamente eles não o utilizam. A Coleção Z permanece fechada, perpetuamente fora do acesso de observadores. Mais irônico é que essa fantástica coleção continua crescendo graças aos esforços de agentes espalhados por todo mundo. A Congregação através de seus tutore e concessionari continuam acrescentando tesouros aos seus vários depósitos. 

Preocupante é o fato de que a Congregação embora disponha de recursos quase infinitos para aquisição desses itens, está disposta a ir às vias de fato para obtê-los caso eles lhes sejam negados. A Irmandade já realizou missões visando infiltrar seus membros em universidades, bibliotecas e museus para roubar e destruir objetos. Há rumores que a própria Universidade Miskatonic foi visitada por agentes apoiados pela Igreja de Boston interessados em remover itens de seu vasto acervo.

A Congregação normalmente não confia em investigadores civis por não ter como discerni-los de cultistas, ou de pessoas que possam vir a se tornar cultistas influenciados pela leitura dos tomos. O conflito entre investigadores e irmãos acaba sendo inevitável na maioria das vezes. Os irmãos não estão dispostos a deixar que esse conhecimento caia nas mãos daqueles que eles consideram despreparados para lidar com esse material.

Por mais terrível que possa parecer, os irmãos estão dispostos a tudo para evitar a proliferação desse saber. E investigadores com boas intensões descobriram da pior maneira possível que os clérigos podem ser tão implacáveis quanto os próprios cultistas. Não importa qual será o custo em vidas, para a Congregação qualquer coisa é melhor do que colocar em perigo as almas de milhões.          

Tema


O tema Congregação é menos óbvio do que pode parecer. 

Enquanto a Congregação tem um componente teológico, o tema da "fé testada até os seus limites" não é o único existente. A Ordem da Espada de St. Jerome representa uma intrusão do mundo moderno por uma força arcaica e tradicional e vice-versa. Lovecraft em muitos momentos de sua obra parece focar na noção que as coisas antigas eram melhores, que o mundo era mais bonito e mais prático no passado, e que a humanidade se torna menos preparada para lidar com os problemas advindos do Mythos a medida que se distancia de suas tradições milenares. "Ninguém nestes tempos gosta de admitir, mas muitos de nossos problemas, estão relacionados diretamente com nossos posicionamento modernista diante do mundo atual." 

No universo de Lovecraft aqueles velhos sábios e filósofos de mente fechada, tradicionalistas e preconceituosos são muitas vezes os únicos capazes de compreender e enfrentar os perigos do mundo. São eles que guardam os segredos, que organizam os ritos, que preservam o saber antigo intocado. Enquanto isso, indivíduos com a mente aberta, buscadores da verdade e com atitude cosmopolita, são muito provavelmente aqueles que não irão compreender a ameaça, que vão abrir os portais e ser incapazes de enfrentar o horror de frente. Enquanto os antigos são a resistência, os novos são os cordeiros.

Em contra-partida, alguns membros da Congregação são plenamente capazes de recorrer a artifícios do mundo atual para enfrentar o mal. É claro, eles irão buscar rituais consagrados, passagens na bíblia e crucifixos, mas também vão confiar em carros velozes, metralhadoras automáticas e explosivo C-4 se preciso for. A modernidade pode oferecer alguns benefícios afinal de contas. 

De certa forma o tema das Congregações religiosas não é apenas "Ignorância é uma benção", mas "Ignorância é uma necessidade". A Irmandade não compreende a natureza do Mythos e nem se esforça em tentar. Eles preferem ver o Mythos como nada além de uma horda de criaturas malignas da demonologia Cristã, Hebraica e Islâmica. Ponto final! O que é diferente, estranho, bizarro ou incomum é maligno e não natural, deve portanto ser destruído. Os membros da Congregação vêem a humanidade como o padrão e tudo que foge a ela, passa a ser um risco no grande plano da criação.  

Mesmo aqueles cuja determinação é balançada pelo conhecimento do Mythos sabem que é melhor acreditar em uma mentira (ou uma meia-verdade) do que acreditar em um mundo de escuridão, pessimismo e falta de esperança. Se Deus não existisse, nada faria sentido, portanto Deus tem que existir

Lovecraft especulava que "a humanidade fugiria para a segurança de uma nova era das trevas" se nós fossemos capazes de compreender nosso lugar no cosmos. A Congregação talvez esteja entre os primeiros a fugir para o obscurantismo e abraçar a ignorância como um mecanismo necessário para nossa sobrevivência como espécie. 

Em um primeiro momento, essa postura pode parecer pouco atraente para os jogadores que desejam interpretar caçadores de monstros do Vaticano. Contudo é preciso fazer uma distinção entre os membros da Congregação e simples fanáticos religiosos. A Irmandade de St. Jerome tem uma missão divina: proteger a humanidade custe o que custar. Eles irão arriscar sua vida, sua sanidade e até mesmo suas almas para defender a raça humana. Acima de qualquer coisa, eles estão dispostos a enfrentar essas forças e seus métodos embora questionáveis, são sim, muito nobres.   

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