domingo, 26 de junho de 2016

O Lobisomen de Bedburg - A Chocante Confissão de Peter Stumpf


Dependendo em quem você quiser acreditar, Peter Stumpf foi um sujeito extremamente perturbado, alguém com uma doença mental não diagnosticada, uma vítima das Guerras Religiosas entre Católicos e Protestantes, ou um Lobisomem agindo sob o comando do próprio Demônio.

Pouco se sabe a respeito das origens ou da vida pregressa de Peter Stumpf, e o que o levou a eventual confissão de que ele seria responsável pela morte de dúzias de inocentes. 

O que nós sabemos a respeito de Stumpf é que ele era um fazendeiro na pequena cidade alemã de Bedburg no final do século XVI. Ele provavelmente levava uma vida árdua, semelhante a outros tantos aldeões nessa época de grandes provações e poucas recompensas.

O sujeito foi capturado em 1589 após uma série de horríveis crimes ocorridos nas cercanias de Bedburg, brutais até para aquele período de extrema violência. À princípio, acreditava-se que os sangrentos assassinatos eram o resultado do ataque de animais selvagens, provavelmente lobos que vagavam pela região coberta de florestas.

Stumpf se tornou suspeito dos crimes depois de ter sido visto andando pela floresta à noite, justamente quando um grupo de caçadores contratados para eliminar a alcateia procuravam pelas feras. Os caçadores rastreavam um enorme lobo negro até uma área isolada da floresta, e perderam suas pegadas. Logo em seguida, eles avistaram Stumpf com roupas sujas de sangue e em atitude suspeita. O fazendeiro não soube explicar porque estava vagando pela floresta àquela hora da noite. Também afirmou que não havia visto lobo algum, o que para os caçadores era impossível, uma vez que o animal deveria ter passado direto por ele.

Mais tarde, os caçadores teriam contado uma estória ainda mais incrível, na qual teriam testemunhado Stumpf se transformar de lobo em homem bem diante de seus olhos. Mas essa estória só foi relatada durante o julgamento que se deu semanas mais tarde.


Os caçadores acompanharam o fazendeiro até sua casa e retornaram para Bedburg antes do amanhecer. Três dias se passaram e uma ovelha foi encontrada morta no campo. Os caçadores foram até o lugar para verificar se um lobo era o culpado. Na ocasião, os homens foram acompanhados pelo Magistrado da Cidade e casualmente comentaram com ele sobre o sujeito estranho que haviam encontrado andando pela floresta.

Impressionado, o Magistrado exigiu que eles o acompanhassem até a casa de Stumpf. Ao chegar lá, encontraram o fazendeiro de cama, supostamente doente, sofrendo de horríveis dores de cabeça. O Magistrado o entrevistou e quando Stumpf não foi capaz de explicar onde esteve na noite anterior ou oferecer um álibi sólido, acabou preso. Na casa, os homens encontraram roupas sujas de sangue e Stumpf não soube explicar de quem era o sangue já que ele não tinha ferimentos. O fazendeiro não reagiu, simplesmente se entregou de bom grado e foi escoltado para Bedburg.

Na cidade ele foi "questionado" por outros dois magistrados. De acordo com a fonte principal detalhando os eventos, um documento intitulado "A Amaldiçoada Vida e Morte de Stubbe Peeter" redigido por George Bores; após ser esticado na tábua pelas autoridades, ele confessou seus crimes medonhos: 

"De sua própria boca ele relatou todo mal que havia feito em sua vida, e tornou conhecido o fato de ter cometido enormes vilanias".     

Segundo os Autos do Processo contra Peter Stumpf, na época com 37 anos de idade, havia muito o que confessar. Sob severa tortura ele contou que aos 12 anos deu início ao serviço das artes negras e da feitiçaria, tornando-se Servo do próprio Demônio. O fazendeiro continuou relatando como Beelzebub em pessoa o presenteou com um cinturão mágico que lhe permitia "assumir a forma de um lobo, forte e poderoso, com olhos que enxergavam na escuridão, garras afiadas e presas cruéis que ele usava para retalhar suas vítimas". Como lobo ele podia correr pelas florestas e campinas sem que ninguém desconfiasse de sua identidade e assim matar impunemente.

Quando perguntado a respeito do paradeiro desse cinturão mágico, Stumpf insistiu que o deixara cair pouco antes de ser encontrado pelos caçadores na floresta. Sem os poderes do cinturão ele se sentia incompleto, o que se refletia nas dores lancinantes de cabeça que o atormentavam - uma punição do diabo por ele ser descuidado.


Após uma busca na Floresta, na qual nenhum cinturão mágico ou não vou encontrado, Stumpf relatou que o diabo o havia contatado à noite e dito que esconderia o objeto para que ele não caíssem nas mãos de ninguém. O Diabo havia ficado furioso com seu servo por ele ter sido capturado e por ter revelado suas nefastas barganhas.

Embora soe ridículo e fantástico, o relato foi corroborado por testemunhas que surgiram de todas as partes afirmando "sempre terem desconfiado de algo diabólico" a respeito do fazendeiro. Isso e a palavra de dois caçadores que posteriormente "lembraram" ter visto a transformação do lobo em homem, foram suficientes para construir todo um caso contra ele.

O fazendeiro revelou em seu julgamento diante de uma platéia aterrorizada que usou o cinturão ao longo de muitos anos com o intuito de se transformar em um Licantropo. Ao usar esse terrível poder, Stumpf explicou que se sentia compelido a consumir sangue e carne. Um desejo incontrolável de saciar sua sede matando bezerros recém nascidos, às vezes com os próprios dentes, para beber seu sangue ainda quente. Mais tarde, ele passou a matar e devorar vítimas humanas.

Exatamente quantas pessoas Stumpf teria matado não ficou claro para o tribunal. Em alguns momentos ele dizia que haviam sido 7, depois aumentava para 10 e finalmente surgiu com a soma de 14. Depois afirmou que 14 eram apenas as crianças, o que incluía seu filho Johan de quem ele havia devorado os miolos crus em meio a um frenesi assassino. Sua longa lista de atrocidades incluía ainda o assassinato de duas mulheres grávidas, cujos fetos ele também teria canibalizado.

Perante os juízes explicou que o Cinturão causava um apetite sexual voraz o que o obrigava a cultivar amantes, buscar prostitutas e quando estas faltavam, atacar mulheres. Várias delas teriam engravidado dele, dando origem a crianças que segundo o fazendeiro cresceriam para virar lobisomens. Stumpf chegou a nomear três mulheres com quem teria tido relações sexuais que residiam em Bedburg, sendo que uma delas chamada Katherina Trompin teria parido uma criança com cabeça de lobo e corpo de bebê. Trompin foi presa e acusada de conluio com feitiçaria, muito embora um exame tenha atestado que ela era virgem e que portanto não poderia ter tido um bebê. Não obstante ela acabou sendo julgada junto com outra mulher de nome ignorado que seria amante do fazendeiro.

Após quatro semanas de julgamento e descrições chocantes, Stumpf foi sentenciado à morte.

É até possível que Stumpf tenha cometido crimes brutais. Assassinos em série sempre estiveram presentes ao longo da história, aflorando em todas as sociedades humanas. Também é bem provável que ele tenha confessado esses crimes, conforme consta nos autos oficiais de seu processo. Criminosos dessa natureza, por vezes tendem a buscar um tipo macabro de "reconhecimento" após sua captura. É como se eles quisessem ter seu "trabalho" conhecido pelo maior número de pessoas. É preciso compreender entretanto que uma confissão não significa muito... por vezes, assassinos em série, mesmo nos dias atuais inventam vítimas que não existem, resultado de suas fantasias e ansiedades. Além disso, as torturas podem ter resultado em confissões fictícias para ganhar a clemência dos verdugos.  


Porém, também já foi especulado que o fazendeiro possa ter sido simplesmente uma vítima do conturbado cenário político da época com histeria a respeito de lobisomens e outras criaturas sobrenaturais. Bedburg, integrava uma região dominada pelos Protestantes, expulsos em 1587 pelo Conde Werner von Salm-Reifferscheidt-Dyck e seus soldados Católicos. Alguns sugerem que Stumpf fosse Protestante como muitos dos que residiam na área, e que ele pode ter sido usado como exemplo para os demais. 

Aqueles que defendem essa teoria utilizam como evidência o fato de que a execução de Stumpf contou com a presença de nobres, dignatários e até de Príncipes da Alemanha que vieram de longe para assistir a execução - algo estranho para a nobreza da época. Trata-se de algo incomum, uma vez que os nobres preferiam se manter distantes desse tipo de execução por considerar o martírio algo desagradável e pedestre. É possível, entretanto, que os alegados crimes fossem tão fantásticos que mesmo a aristocracia demonstrou interesse em conhecer o homem por traz deles.

Seja lá qual for a verdade sobre os crimes, o que não faltam são detalhes sobre a brutal maneira como Peter Stumpf foi executado. 

A amante de Stumpf e Katherina Trompin foram condenadas a morrer queimadas na fogueira. Tratadas como feiticeiras elas foram enforcadas antes de serem amarradas em postes e terem o corpo incendiado com óleo. O fim de Stumpf seria muito mais elaborado. Para o Lobisomem de Bedburg os Juízes escolheram uma das maneiras mais cruéis de execução - ser partido na Roda

Dessa maneira, em 31 de outubro de 1589, Stumpf foi enfiado numa gaiola de ferro transportada por uma carruagem até a cidade de Colônia, o maior burgo da região. Durante seu caminho até a praça da cidade os cidadãos gritavam e jogavam objetos nele. A princípio o Lobisomem reagiu xingando os populares, mas depois de quase ser linchado, se satisfez em sentar quieto.

Na praça ele foi amarrado com cordas a uma roda de madeira, pulsos, tornozelos e pescoço firmemente imobilizados em ângulos que causavam uma dor excruciante. A primeira parte do suplício foi marcada pelo uso de alicates afiados de metal em brasa que arrancaram pedaços inteiros de pele e músculos de suas pernas e braços para deixar os ossos expostos. Então, usando uma machadinha, o carrasco com grande habilidade quebrou os ossos separando os membros do tronco, um a um.     



Depois de morrer, a cabeça de Stumpf foi decepada com a mesma machadinha e separada do corpo. Seu corpo e membros destroçados foram colocados na mesma pira em que ardiam suas concubinas, mortas na véspera.

Quanto a cabeça de Stumpf, ela foi fincada em um mastro preso na roda da tortura, uma placa com o desenho de um lobo foi pregada logo abaixo dela. Ela foi disposta no centro da praça para apreciação pública, como um alerta a todos os bruxos e feiticeiros. 

A cabeça do "lobisomem" teria desaparecido duas noites depois, dando margem a todo tipo de rumor e lenda a respeito de um fantasma humano com cabeça lupina vagando pelas ruas de Colonia. O Fantasma do Lobisomem de Bedburg assombrou a cidade por muitos anos, fazendo com que cidadãos buscassem a benção de São Hervé que tradicionalmente protege as pessoas contra o ataque de lobos. São Hervé ganhou uma capela nas proximidades de onde ocorreu a execução, o que fez com que o Fantasma deixasse de ser visto.    

Hoje, não é possível saber se Peter Stumpf foi ou não o responsável pelos horrendos crimes que assombraram Bedburg. Mas seu nome sobrevive, cercado de infâmia e horror, considerado por muitos como um dos mais notórios criminosos de seu tempo, uma época de superstição, brutalidade e violência.

6 comentários:

  1. e eu achando que as mortes de game of thornes eram cruéis

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  2. Já tinha ouvido falar do único caso do "lobisomen real", mas nunca com riqueza de detalhes. Valeu, mais um acerto crítico do blog.

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  3. Obrigada pelo ótimo artigo, bem detalhado. :)

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  4. Excelente matéria. Parabéns pelo esmero.

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  5. Muito bom, mais uma matéria excelente.
    (・ω・)b

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  6. Se ele era um psicopata? Provavelmente. Se era um lobisomen? Provavelmente não. Bruxas e Lobisomens eram os nomes que a população dava para os assassinos em série da época e em quase todos os casos eles eram culpados. Geralmente os que eram inocentes sempre declaravam isso momentos antes da execução.

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