terça-feira, 24 de setembro de 2013

Cinema Tentacular: Invocação do Mal (The Conjuring) - Horror típico, mas muito eficiente


Tem um filme antigo que costumava passar direto nos corujões da madrugada e que me deixava apavorado quando eu era criança. Eu devo ter visto umas duas ou três vezes e tenho certeza, alguns aqui também devem ter assistido.

Era um daqueles típicos filmes de casa mal assombrada atormentando uma família tipicamente americana dos anos 1970. Infelizmente não lembro o nome. A trama não era nova (e francamente), acho que nunca foi. A coisa começa quando a tal família, normalmente formada por pai e um monte de filhos, se muda para uma velha casa isolada que estava vazia há muito tempo e que foi comprada como uma verdadeira barganha. Logo, coisas estranhas começam a acontecer, mas à princípio ninguém liga muito, pois, afinal de contas "assombrações não existem". Só que lá pelas tantas, os episódios inexplicáveis vão se multiplicando e não há como tapar o sol com a peneira. Há algo de estranho na casa e cabe a um parapsicólogo ou exorcista ajudar a família e se livrar da presença indesejada. Se a história for "baseada em fatos reais" melhor ainda, pois isso concede um certo grau de verossimilhança.

É possível que alguns tenham reconhecido o filme do qual estou falando, mas o mais provável é que a maioria tenha pensado em pelo menos meio dúzia de outros cuja premissa é exatamente essa. Desde Poltergeist, Atividade Paranormal e Os Outros passando por clássicos como Desafio do Além e um dos meus preferidos "The Legend of Hell House" (o filme original da década de 70), casas mal assombradas são um tema recorrente no cinema de horror. Francamente, parece missão impossível mostrar algo novo sobre o tema "Casa Assombrada", quase um sub-gênero dentro das produções.

Virtualmente já foi feito de tudo para assustar o público desses filmes e nos últimos tempos, causar espanto com sombras, portas que batem, correntes de vento e ruídos, soa bobo, um exercício de futilidade de diretores que muitas vezes gostam de dizer "esse filme será diferente".

Mas em geral, nunca são diferentes. Ou quase nunca.


Com certo grau de reticência, fui assistir o filme Invocações do Mal ("The Conjuring") que estreou na semana passada - sexta feira 13, esperando mais do mesmo. A mesma estória de sempre, os mesmos sustos baratos, os mesmos recursos dramáticos e a mesma conclusão deixando à desejar.

A sinopse no jornal também não ajudou em nada, diz lá:

"A família Perron se muda para uma casa na Nova Inglaterra onde são aterrorizados por assombrações. A única esperança deles é contar com a ajuda de um casal de parapsicólogos para exorcizar o lugar".

Que puxa... se tivesse algum susto com gato saltando do nada, eu disse a mim mesmo, levantaria para ir embora.

Sentei no cinema e quando o filme começou descobri que o diretor apelou para um truque muito inteligente. Invocações do Mal não quer ser novo, não pretende mostrar novidades ou surpreender. Seu diretor não quer parecer genial ou redefinir o gênero cansado de guerra, pelo contrário. A grande sacada da produção é tentar ser um filme no mesmo esquema que você já viu dezenas de vezes, mas realizado de maneira extremamente competente do início ao fim.


Todos os chavões do típico filme de casa assombrada estão presentes, mas eles são executados com um timing e contam com uma atmosfera perfeita. Essa é, na minha opinião, a fórmula para superar a palavra cliché (normalmente algo mortal para os filmes de horror). Por mais batida que seja a estória, ela funciona, criando uma atmosfera de perplexidade e de razoável tensão, entrecortado por períodos de tranquilidade. Bons filmes de horror são capazes de extrair dessa combinação ótimos sustos: o filme transcorre tranquilamente até que há uma sacudida e você não consegue desgrudar os olhos.

Tem uma cena em especial, logo no início que serviu para me fisgar. Minha esposa não é fã de filmes de horror, por isso temos um acordo: sempre que eu quero ver um filme do gênero, acabamos indo ao cinema ver filmes diferentes, cada um em uma sala. Dessa forma me livrei de várias comedias românticas açucaradas e ela de noites mal dormidas, é um trato justo. Pois bem, do meu lado estava um casal que aparentemente não tem esse tipo de acordo. A garota estava realmente apavorada, e quando a cena a que me referi aconteceu, ela deu um salto tão alto que achei que ela estava passando mal. No escuro, a duas poltronas de distância ouvi ela cochichando: "Eu devia ter ido no banheiro antes de sentar", e dizendo isso levantou para sair aos trancos e barrancos pelo corredor.

Então, em consideração a aqueles que se deixam envolver pela atmosfera de um bom filme de horror aqui vai um aviso: deixem suas bexigas fazer o serviço durante a apresentação dos trailers.

Mas voltemos ao filme.


Logo no prólogo temos uma pequena introdução em que um casal de parapsicólogos tenta ajudar duas enfermeiras às voltas com uma boneca amaldiçoada. Eu franzi a testa logo no início e continuei fazendo careta quando apareceram as célebres palavras "essa estória é baseada em um acontecimento real". Parecia um mal sinal... mas as coisas foram entrando nos eixos e me deixei levar pela trama.

Em 1971 Carolyn e Roger Perron (Lili Taylor e Ron Livingston) acabam de se mudar para uma tranquila fazenda no interior de Rhode Island. O casal, acompanhado de suas cinco filhas (!!!) tentam se estabelecer e se acostumar com a nova vida. Mas coisas estranhas ocorrem logo na primeira noite. Uma presença invisível e extremamente ameaçadora parece pairar sobre a casa: portas batendo, marcas no corpo da mãe, sussurros vindos do nada e um amigo imaginário conquista a confiança da filha mais nova. A família encontra uma passagem bloqueada por tábuas que leva a um porão repleto de antiguidades. Acredite, nada disso é spoiler, pois todos esses elementos já foram vistos em outros filmes.

O que faz a diferença é a maneira como as coisas são mostradas e como a apreensão vai sendo construída até descambar em algum susto legítimo. Tem uma cena em que uma das meninas vê uma espécie de sombra no quarto escuro que outra não é capaz de identificar. "Ele está bem ali. Bem atrás da porta!" ela diz engasgando no choro. Essa cena, que não mostra nada, sozinha consegue ser mais assustadora que muitos filmes inteiros.


Diante dos incidentes cada vez mais graves e frequentes, a família procura a ajuda de profissionais. Entra em cena o casal lá do início do filme Ed e Lorraine Warren (Patrick Wilson e Vera Farmiga, ambos excelentes passando uma credibilidade notável aos personagens) que aceitam investigar os acontecimentos e tentar encontrar uma solução para o dilema. Mas obviamente, os fantasmas não estão dispostos a se render tão facil. Logo, o mistério se torna incrivelmente desafiador e inacreditável.


É interessante ressaltar que o casal de parapsicólogos/ demonologistas/ exorcistas, realmente existe e são considerados "legítimos caçadores de assombração", famosos nos Estados Unidos por realizar estudos paranormais desde o início dos anos 1970. Os Warren possuem uma enorme coleção de objetos supostamente amaldiçoados recolhidos durante as suas investigações, para que ficassem em um lugar seguro. Supostamente "Invocação do Mal" tem como base o caso dos Perrin, investigado pelos Warren e considerado por eles próprios como um dos mais chocantes. O roteiro, também buscou inspiração em trechos do diário de uma das meninas, escrito ao longo de mais de dez anos sobre as assombrações que afligiam sua família, algo que no filme foi alterado.

Mesmo manipulando alguns fatos e distorcendo certas verdades para adequar-se à narrativa, Invocação do Mal resulta em um filme de terror que não tem vergonha de contar a mesma estória pela milionésima vez, sabendo que ao fazê-lo de maneira competente estará automaticamente perdoado.


O diretor Jason Wan esteve à frente de produções do gênero em outras oportunidades; ele é o responsável pelo primeiro (e melhor) Jogos Mortais e pelo competente Insidious (outro filme de horror que vale a pena ser assistido). Amparado por um elenco extremamente afinado, num roteiro enxuto e apostando em entidades demoníacas, em cenas macabras com praticamente zero efeito digital, ele consegue na base da sutileza, sem apelar para sangue e vísceras, criar um dos melhores filmes de horror do ano.  


Sucesso inesperado nos Estados Unidos, onde arrecadou mais de 100 milhões, tudo indica que "The Conjuring" deve ganhar uma continuação em breve. Possivelmente mais algum caso espinhoso investigado pelo casal Warren em sua luta contra os poderes diabólicos. 


Vá para o cinema sem medo, e volte para casa apavorado...

Trailers:




Gostou? Leia também a resenha desses filmes:

The Poughkeepsie Tapes






5 comentários:

  1. http://www.mundogump.com.br/uvb-76-misteriosa-radio-russa-so-transmite-numeros/

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  2. Eu gostei muito não, mas dá para passar o tempo de boa. Agora, sobre os filmes citados no começo da resenha, "Os Outros" é infinitamente superior, final sensacional e atmosfera totalmente obscura e sufocante.

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  3. Será que o filme que vc tanto via nas sessões do corujão não era Amytiville, também baseado em fatos reais e investigado pelo casal Warren? Me convenceu, foi assistir esse aí, fiquei curioso agora, rss...

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  4. Filmão, o melhor mais do mesmo em terror dos ultimos anos

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  5. Aproveitando para colocar minha leitura do blog em dia, me deparei com esse falando de um dos raros filmes que me despertou interesse esse ano, amei a fotografia, queria aproveitar e se não for incomodo que vocês fizessem um post sobre o casal Warren, vi alguns casos que eles investigaram em uma série do Discovery chamada Assombrações, a Folha publicou algumas fotos do museu, e hoje o Fantástico vai passar uma reportagem mostrando o museu também, acho bem interessante esses Ghost Hunter para personagens

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